1. Desejamos mais riqueza por constituir meios admiráveis para termos mais liberdade para levar o tipo de vida que temos razão para valorizar. A utilidade da riqueza está nas coisas que nos permite fazer. Trata-se de uma relação que não é exclusiva nem uniforme. Sen (2000) destaca que os fins e os meios do desenvolvimento se relacionam sobretudo com a melhoria da vida que levamos e das liberdades que desfrutamos.
2. FORMAS DE PRIVAÇÃO DE LIBERDADE: fomes coletivas, subnutrição, pouco acesso a serviços de saúde, saneamento básico ou água tratada, desigualdade entre homens e mulheres, negação da liberdade política e dos direitos civis básicos. Essas privações restringem a vida social e política, sendo que a negação da liberdade política e dos direitos civis básicos devem ser consideradas repressivas mesmo sem acarretar outros males, pois constituem a liberdade humana.
3. PROCESSOS E OPORTUNIDADES: A visão de liberdade envolve os processos que permitem a liberdade de ações e decisões como também as oportunidades reais que as pessoas têm, dadas as suas circunstâncias pessoais e sociais. A distinção entre os aspectos do processo e da oportunidade envolve um contraste substancial e é necessário não restringir atenção a um ou outro, tendo em vista que ambos têm sua importância na abordagem do desenvolvimento como liberdade.
5. SISTEMAS AVALIATÓRIOS:
a) RENDAS E CAPACIDADES: Sen (2000) destaca que, no aspecto avaliatório, a abordagem do “desenvolvimento como liberdade” se diferencia da ética prática e da análise de políticas econômicas mais tradicionais (p. 34), por possuir uma base factual diferente que se concentra nas características das vidas humanas e nas liberdades substantivas, no descontentamento criativo e na insatisfação construtiva. O autor destaca que as privações de renda e de capacidade apresentam encadeamento correlatos.
b) POBREZA E DESIGUALDADE: com essa nova base informacional, a pobreza pode ser vista como uma privação de capacidades básicas, que pode se refletir em morte prematura, subnutrição, morbidez permanente, analfabetismo, e não apenas como baixa renda. Neste sentido, o desemprego não é somente uma deficiência de renda que pode ser compensada por transferências do Estado, mas também uma fonte de efeitos debilitadores muito abrangentes sobre a liberdade, a iniciativa e as habilidades dos indivíduos: (1) contribui para a “exclusão social” de alguns grupos; (2) acarreta a perda de autonomia, de autoconfiança e de saúde física e psicológica.
c) RENDA E MORTALIDADE: Sen (2000) aborda as influências causais dos contrastes entre os padrões de estilo de vida julgados segundo a renda per capita e os julgados segundo o potencial para sobreviver até idades mais avançadas incluem disposições sociais e comunitárias.
d) LIBERDADE, CAPACIDADE E QUALIDADE DE VIDA: pelo fato de que o conjunto das liberdades relevantes ser muito amplo, essa abrangência pode ser um problema para uma abordagem “operacional” do desenvolvimento centrado na liberdade. A perspectiva baseada na liberdade guarda semelhança genérica com a preocupação comum com a “qualidade de vida”, parecem representar um afastamento das tradições estabelecidas na economia, mas guardam sintonia com as linhas de análise que são parte da economia profissional desde o princípio (Aristóteles, Adam Smith: “necessidades” e “conexões de vida”). A origem da economia foi motivada pela necessidade de estudar a avaliação das oportunidades que as pessoas têm para levar uma vida boa e as influências causais sobre essas oportunidades. Os primeiros economistas destacavam que a importância da renda era instrumental, dependente das circunstâncias. Neste sentido, ao concentrar atenção em funcionamentos resultantes em vez de apenas em mercadorias, Sen (2000) procura recuperar parte da herança da economia profissional.
6. VALORES E O PROCESSO DE VALORAÇÃO: Sen (2000) destaca que a liberdade individual é um produto social, existindo uma relação de mão dupla entre (1) as disposições sociais que visam expandir as liberdades individuais e (2) o uso de liberdades individuais para melhorar a vida de cada um e tornar as disposições sociais mais apropriadas e eficazes. As concepções individuais de justiça e correção dependem de associações sociais (formação interativa de percepções do público e compreensão cooperativa de problemas e soluções). O autor destaca que a análise e a avaliação de políticas públicas têm de ser sensíveis a essas diversas relações.
7. TRADIÇÃO, CULTURA E DEMOCRACIA: a questão da participação é central para problemas que têm minado a força/alcance da teoria do desenvolvimento, sendo que a questão mais séria está na fonte de autoridade e legitimidade. Existe um problema valorativo na decisão do que se deve escolher se e quando acontecer de algumas partes da tradição não puderem ser mantidas juntamente com mudanças econômicas e sociais que possam ser necessárias por outras razões. Para Sen (2000), a escolha não é fechada nem da alçada dos “guardiães” da tradição, mas são as pessoas diretamente envolvidas que têm de ter a oportunidade de participar da decisão do que deve ser escolhido. Assim, o conflito ocorre entre o valor básico do que se deve permitir às pessoas decidir livremente que tradições elas desejam ou não seguir E a insistência em que tradições estabelecidas sejam seguidas ou em que as pessoas têm de obedecer às decisões de autoridades religiosas ou seculares que impõem a observância das tradições. Para o autor, se houver um conflito real entre a preservação da tradição e as vantagens da modernidade, torna-se necessário uma resolução participativa. As tentativas de tolher a liberdade participativa com pretexto de defender valores tradicionais passam ao largo da questão da legitimidade e da necessidade de as pessoas afetadas participarem da decisão do que elas desejam e do que elas estão certas ao aceitar.
8. OBSERVAÇÕES FINAIS: a visão do desenvolvimento a partir das liberdades substantivas das pessoas tem implicações muito abrangentes. Em uma perspectiva avaliatória, envolve a necessidade de aquilatar os requisitos de desenvolvimento com base na remoção das privações de liberdade que podem afligir os membros da sociedade. Neste sentido, o processo de desenvolvimento não difere da história sobre o triunfo sobre essas privações de liberdade. A motivação fundamental da abordagem do “desenvolvimento como liberdade” consiste em chamar atenção para aspectos importantes do processo de desenvolvimento e não em ordenar todos os estados. Desta forma, busca uma visão adequadamente ampla do desenvolvimento para enfocar o exame avaliatório de coisas que são de fato importantes e, particularmente, evitar que sejam negligenciados assuntos decisivamente importantes.
REFERÊNCIA:
SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade, S. Paulo: Cia. das Letras, 2000
(Cap. I).
Um comentário:
Muito bom seu fichamento do primeiro capítulo,gostei muito,pois está bem sucinto porém sem deixar ele vazio você colocou as ideias centrais .parabéns!
Postar um comentário