sexta-feira, 28 de junho de 2013
Por dentro e por fora dos protestos: um panorama.
Nesta postagem tento reunir algumas impressões sobre as manifestações em que estive presente. O objetivo é abrir debate e não concluir, o que seria muito pretencioso neste momento. Também não prometo grandes novidades.
Fui a cinco manifestações no Rio durante o mês de junho, nos dias 10, 14, 17, 20 e 27. Minha pesquisa de doutorado é sobre ativismo e internet e me gerou interesse em apreciar in loco como (e se) a mobilização virtual transborda para o espaço público.
Não foi a primeira vez (nem serão as últimas) que participei de manifestações de rua. Lembro das que clamaram o impeachment do Collor em 1992, dentre várias outras que não valem ser destacadas aqui. Mas o que parece ser diferente nas manifestações recentes? Primeiro, o fato de serem mobilizadas inicialmente pelas redes sociais configuradas na internet (em especial o Facebook, mas também Twitter, Whatsapp e Youtube). Segundo, pela maioria constituída por jovens que não estão vinculados à organizações, associações ou partidos.
Cabe pensar se este tipo de ação coletiva do que chamo aqui de movimentos da multidão remete mais a um individualismo em rede, onde cada um mobiliza suas redes, do que a organizações que mobilizam seus membros. Chama atenção a ausência de vinculação dos participantes à estruturas organizacionais. E mesmo aqueles que tem vínculos também parecem mobilizar suas redes de contatos utilizando plataformas de tecnologias da internet. Não estou aqui julgando esse lado egóico nem a idéia de individualismo,que pode ser visto como ruim, enquanto o coletivismo seria bom. No entanto, acho que essa dicotomia não ajuda muito no momento em que parece haver mais imbricamento e hibridismo nesta rede de redes, que não está dada, está aberta a escapes e chegadas de quem escolhe participar ou não.
A voz da multidão agrega uma série de demandas que estavam represadas. Não vou listar todas aqui, pois não tenho isso sistematizado, mas vale destacar que na primeira manifestação, que tinha menos de mil pessoas, o aumento das passagens era claramente o alvo principal. A partir da segunda, que reuniu cerca de 10 mil pessoas, outras pautas começam a ser incorporadas. Na terceira, a quantidade de pessoas aumentou para mais de 100 mil pessoas e se viu uma explosão das demandas também. Na quarta, 1 milhão de pessoas foram às ruas do Rio, comemorar a redução das passagens, mas sinalizar que não eram apenas R$ 0,20.
No quinto ato que fui, hoje, cerca de 10 mil pessoas continuaram a protestar, mas sem o clamor da multidão, em uma manifestação puxada por atores que estão no que pode ser considerado como esquerda, incluindo partidos e sindicatos. No início da semana, na segunda (24/6), houve uma manifestação do que pode ser considerada uma direita, com direito a saudações nazi-fascistas, reunindo cerca de 3 mil pessoas. Nesta não fui. Resta saber onde estão as pessoas que compõem o quadro do milhão que estava nas ruas no dia 20/6. Mas isso é um exercício que talvez o tempo ajude a responder.
Estas manifestações trazem elementos para pensar em mudanças no modelo político institucional, mais especificamente na relação com seus representados, que querem mais canais de participação, o que ficou claro quando os protestos começaram a canalizar demandas que vão além do aumento da tarifa de ônibus, que foi revogado, sendo uma importante vitória. Fora isso, dois pronunciamentos da presidenta e uma série de fatos durante esta semana mostram o potencial de ação em uma mobilização em rede.
Os canais de representação não estão sendo suficientes para lidar com as demandas de quem representam. O voto ainda é importante, mas cada vez mais, em boa parte em função de um novo contexto de comunicação, que possibilita a participação das pessoas, novos canais de participação nas decisões políticas que afetam a todos (como na configuração de políticas publicas e investimentos) se fazem necessários.
Uma coisa que parece ser comum destes protestos com outros recentes ao redor do mundo, tais como a Primavera Árabe, Occupy e Indignados é sua organização e mobilização pela rede, pela internet. E mesmo que pareçam recolhidos, como no caso do Occupy, as pessoas que participaram mantém-se conectadas em rede, prontos a emergir em momentos que sejam propícios no espaço público. No entanto, no caso brasileiro, não surgiu uma plataforma de sustentação e deliberação online, como no Occupy e nos Indiganados, por exemplo, o que pode ser visto como um elemento diferenciador até então, e que talvez reforce até a ideia de que se trata de um individualismo em rede.
Além da internet, outro elemento comum com estes outros movimentos está na fraca participação dos partidos e a busca pela abertura de novos canais de participação e representação, nem sempre conseguidos.
Cabe destacar que as formas de organização e manifestação sempre passam por mudanças e inovações. Estas formas configuram repertórios de ação coletiva, e parece que a internet traz novas possibilidades, ampliando o repertório de agir coletivamente. Venho pesquisando, por exemplo, a emergência de um repertório digital de ação coletiva, que parece se configurar com o advento da internet. Espero, na tese, apontar sinais disso, ao menos.
Por fim, a violência parece ser um componente dos protestos contemporâneos e isso não é de hoje. As forças policiais compõem o cenário de qualquer protesto. No caso brasileiro, temos uma polícia bruta e despreparada para lidar com situações como estas. Além disso, a violência de certa forma acaba sendo um fato político em uma experiência coletiva de conflito, o que faz com que alguns manifestantes também se comportem de forma agressiva. Tem se falado muito da infiltração de agentes entre a multidão, agitando e estimulando grupos de manifestantes mais exaltados e predispostos a agir violentamente. Mas nada justifica as cenas de violência policial que temos visto. Aliás, hoje foi o primeiro ato no Rio em que não houve confronto entre as forças policiais e os manifestantes. Sinal de que pode ser diferente.
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3 comentários:
Interessante análise.
Fiquei com gostinho de quero mais sobre o "repertório digital de ação coletiva".
Aguardo sua tese.
Everton
Gostei da análise dobre os protestos. Fez um apanhado geral do que ocorreu desde a sua formação.
Curiosamente, apesar de não nos conhecermos,sigo você no facebook, justamente pela elaboração de excelentes textos.
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